Criada como mecanismo de defesa, a licitação acaba se tornando a porta de entrada da corrupção
Era
para ser um mecanismo de controle, mas a licitação, instituída pela lei
8.666 de 1993 para garantir os princípios básicos da legalidade, da
impessoalidade, da moralidade, acaba se tornando o veículo por meio do
qual o dinheiro público é usado de modo errado. Casos recentes no Ceará -
inclusive com gestores afastados - foram disparados depois que se
identificaram burlas ao processo licitatório.
Para o
presidente da Associação Cearense do Ministério Público (ACMP), Plácido
Rios, a lei contribui de alguma forma para o cenário. Um dos erros é
creditar ao setor privado a presunção de idoneidade. Nem sempre a
corrupção parte diretamente do gestor. As próprias empresas às vezes se
organizam para realizar as fraudes, dividindo certames ou acertando
previamente os preços. “Não há lei indevassável à corrupção”.
O
que geralmente acontece é que membros da comissão de licitação (ou o
próprio prefeito) estão comprometidos com o esquema, e a licitação finda
sendo direcionada para favorecimento de correligionários políticos, que
são donos de empresas. Esse crime acontece independentemente da
realização das despesas e, portanto, consegue ser identificado a
qualquer tempo - no início ou no final das gestões.
“São
fraudes de toda ordem. O crime organizado já compreendeu que é muito
mais fácil desvir recursos públicos utilizando um bloco de notas fiscais
e de recibo do que cometer um crime a mão armada”, afirma o promotor da
Procuradoria dos Crimes Contra a Administração Pública (Procap), Luiz
Alcântara.
É a partir da fraude na licitação que o dinheiro,
em seguida, poderá ser compartilhado entre os vários integrantes da
quadrilha. A prefeitura pode, por exemplo, referendar a vitória de uma
empresa, às vezes sem sede ou funcionários, de maneira que o lucro do
empresário seja o máximo possível.
“É muito da mentalidade do
pessoal da comissão de licitação, dos gestores e, inclusive, dos
empresários. A licitação passa a ser um entrave burocrático, quase uma
formalidade. É a cultura do que faço o que eu quero, as leis não se
aplicam aqui”, critica o promotor federal Rafael Ribeiro Rayol.
Solução
Então,
a solução seria tornar a licitação algo ainda mais rigoroso? O
secretário-executivo da Controladoria-Geral da União (CGU), Carlos
Higino Alencar, avalia que este não é bem o caminho, porque burocracia
pode trazer a vantagem do monitoramento, mas ao mesmo tempo acaba
deixando o processo mais lento e também dispendioso ao erário.
A
melhor maneira seria, segundo ele, a participação da sociedade nesse
controle e fiscalização. “A Lei de Acesso à Informação (de novembro de
2011) mudou o panorama da opacidade. Hoje qualquer cidadão pode ver os
processos sem demonstrar motivação específica”, frisa.
Além
disso, a própria lei de licitação tem tido avanços e aumentado sua
transparência, de acordo com ele: com o pregão eletrônico e atualização
em tempo real nos portais dos tribunais de contas dos municípios em cada
estado.
Fonte:(Alan Santiago - alan@opovo.com.br)
Nenhum comentário:
Postar um comentário